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Com seca prolongada e fortes chuvas, estudo do MCTIC prevê ‘clima caótico’ até 2100

“Os impactos e os riscos são tão grandes que não existe outra possibilidade que não seja a mais rápida redução de gases de efeito estufa”, alertou o pesquisador Carlos Nobre durante 68ª Reunião Anual da SBPC.

Até 2100, o clima tende a “ficar mais caótico”, com menor grau de previsibilidade, longos períodos secos e extremos de chuva intensa. O alerta foi feito pelo coordenador do INCT de Mudanças Climáticas, Carlos Nobre, durante lançamento do livro Modelagem Climática e Vulnerabilidades Setoriais à Mudança do Clima no Brasil, nesta segunda-feira (4), na 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Porto Seguro (BA).

“Os impactos e os riscos são tão grandes que, na minha opinião, não existe outra possibilidade que não seja a mais rápida redução de gases de efeito estufa, como a COP 21 [21ª Conferência do Clima] preconizou: zerar as emissões até 2050 ou 2060 e chegar a emissões negativas, ou seja, tirar CO2 [dióxido de carbono] da atmosfera”, afirmou o pesquisador. “Esse é um enorme desafio, mas é um problema do qual não temos como fugir se nós não quisermos entregar aos nossos netos e bisnetos um mundo muito difícil de viver.”

Nobre recomendou ao público da palestra que acesse a Comunicação Nacional do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), que, a partir do acordo aprovado na COP 21, terá que ser atualizada a cada dois anos. Desdobramento da última edição do inventário, o livro traz simulações em escala regional e análises de especialistas sobre possíveis impactos de cenários de emissão de gases até 2100 em sete setores – agricultura, biodiversidade, cidades, desastres naturais, energias renováveis, recursos hídricos e saúde humana.

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) elaborou a publicação em parceria com a Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede Clima). O livro teve como editores o coordenador-geral de Mudanças Globais do Clima do MCTIC, Márcio Rojas, o pesquisador do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) José Marengo e o economista Breno Simonini.

O Inpe e o Cemaden são institutos de pesquisa vinculados ao MCTIC.

Vulnerabilidades

Interpretadas por especialistas, as simulações até o fim do século geraram estudos de impactos em diversas regiões brasileiras. Nobre destacou efeitos das mudanças climáticas sobre os biomas, como retração de florestas e expansão de vegetações abertas. O livro aponta que Cerrado e Caatinga teriam maior estabilidade para manter a cobertura nativa do solo, mas, em compensação, a Amazônia seria fortemente afetada em sua parte oriental.

“Isso é muito sério e grave para o Brasil, que abriga a maior biodiversidade do planeta, seguido por Colômbia e Indonésia. Temos um hot spot mundial bem aqui, pertinho de Porto Seguro, na Mata Atlântica. São 450 espécies de aves por hectare”, enfatizou. “Há um processo de savanização da Amazônia, com menos florestas e mais savanas, que formam um cerrado empobrecido.”

Na agropecuária, a projeção de aumento da frequência de dias quentes, com temperatura superior a 34 graus Celsius (ºC), pode prejudicar a produção de café, feijão e leite, e a criação de frangos e suínos. Uma das soluções apontadas para o cultivo de vegetais seria a busca por ambientes tolerantes ao calor e ao déficit hídrico. O climatologista ressaltou que os impactos podem afetar em 90% o milho safrinha e em 80% a soja.

“O Brasil já está quase se tornando o segundo maior exportador de alimentos do mundo, deve passar os Estados Unidos nos próximos 15 anos”, lembrou Nobre. “As mudanças climáticas trazem riscos muito grandes. A única cultura que não sofreria neste século é a cana-de-açúcar, que se estenderia ao sul do país. Arroz, milho, soja e feijão diminuiriam demais a área agriculturável.”

Recursos hídricos

Para recursos hídricos, o estudo evidencia anomalias de escoamento em regiões hidrográficas, com redução da água disponível em praticamente todo o território nacional. O maior impacto percentual aconteceria nas áreas do rio Doce e do rio São Francisco. A vazante aumentaria na bacia do rio Uruguai e em parte da do rio Paraná, com intensificação de cheias no Sudeste, embora, segundo Nobre, o balanço hídrico provavelmente fique negativo, porque uma evaporação crescente superaria o volume proveniente das chuvas.

Na visão do climatologista, o potencial hidrelétrico do país precisa ser encarado com cuidado, com base em um dos mapas do livro. “Detalhamentos mostram que a usina de Belo Monte, no futuro, pode perder pelo menos um terço de sua capacidade”, comentou. “Já a energia eólica ganha com a ampliação da velocidade dos ventos e pode se instalar do Rio Grande do Sul ao Amapá.”

Sobre energia solar, o estudo verificou valores simulados no fim do século menores do que os atuais. As quedas de intensidade de radiação variam de 4% a 8% em todo o Brasil. Em relação ao biodiesel, estimou-se dificuldades na produção de girassol e soja e menor alteração para cana-de-açúcar e mamona, cujas culturas, no entanto, podem sofrem com a carência hídrica.

A vulnerabilidade a desastres naturais vem se intensificando nas últimas décadas e, nas palavras de Nobre, combina duas variáveis em expansão: os extremos climáticos e a exposição ao perigo. “Nós passamos 60 anos de urbanização caótica no Brasil. Temos hoje 5 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco nas periferias das grandes cidades. É um dos mais altos índices do mundo.”

O livro sugere que o Sul, o Sudeste e grande parte do litoral ficarão mais suscetíveis a inundações bruscas, enxurradas e alagamentos. Para as demais regiões do país, o risco pode diminuir devido à queda dos índices de chuva. Nobre citou dados que indicam que, se a temperatura subir 3ºC em 2 mil anos, o nível do mar subiria 10 metros. “Várias cidades teriam que ser abandonadas”, previu. “Londres só tem solução de engenharia para até cinco metros.”

Fonte – MCTIC de 05 de julho de 2016

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