skip to Main Content

Contaminação Da Biodiversidade Por Transgênicos, Parte 3/6

NODARI et. al. (2010) registram que no Brasil, a estratégia voltada à conservação “on farm” vem sendo implementada aos poucos por meio de uma ampla rede de ações dirigidas à manutenção de recursos genéticos na propriedade rural, particularmente aqueles de interesse agrícola, a chamada agrobiodiversidade.

Essas ações contam com uma efetiva participação de movimentos e organizações sociais, onde a ênfase é dirigida para o resgate, conservação de variedades crioulas ou locais e implantação de sistemas agroflorestais em pequenas propriedades rurais.

Dentre as poucas iniciativas governamentais, na época, existia uma implementada pelos Ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário que foi conduzida em parceria com os movimentos sociais e denominada de Centros Irradiadores do Manejo da Agrobiodiversidade (CIMAs).

Trata-se de projeto de caráter comunitário que visa o resgate e a conservação de variedades crioulas ou locais, a implantação de sistemas agroflorestais, o uso de plantas medicinais e fitoterápicos e o manejo alternativo de raças animais, domesticadas ou não.

A diversidade genética e a riqueza de espécies existente no país são ainda pouco conhecidas, pouco manejadas e pouco utilizadas, comparativamente ao potencial que apresentam.

Por outro lado, existem tanto demandas como oportunidades de novas opções para a agricultura familiar, tal qual novas opções para a alimentação, enfrentamento da vulnerabilidade determinada pela estreita base alimentar e também novas opções para o setor empresarial, em particular da pequena agroindústria.

Dentre as várias iniciativas relacionadas à agrobiodiversidade, a CDB aprovou em março de 2006, durante a VIII Conferência das Partes, a Decisão VIII/23. Trata-se da Biodiversidade, Alimentação e Nutrição, cujos propósitos desta iniciativa estão voltados à ampliação do número de espécies utilizadas atualmente em nossa alimentação, mitigação dos problemas decorrentes da simplificação da dieta e fortalecimento da conservação e do manejo sustentável da agrobiodiversidade.

São incorporadas ações de transversalidade em programas e estratégias de subsistência, de alimentação e nutrição, nacionais e internacionais. A racionalidade desta iniciativa se baseia no fato de que a hipótese atualmente mais aceita é que a dieta diversificada é sinônimo de saúde.

Evidências científicas indicam que o uso da diversidade de plantas na dieta reduz os riscos de doenças e de mortalidade (KANT et al., 2000 e KALUZA et al., 2007).

Os consumidores, a cada dia, demandam por alimentos sadios e inócuos para a saúde, livres de agrotóxicos ou outras componentes não usuais na dieta humana. Assim, a relevância da agrobiodiversidade mantida e produzida de forma agroecológica tem dupla relevância para os consumidores.

De um lado a dieta diversificada de alimentos sadios e de outro lado, o balanço nutricional de variedades crioulas, que é melhor do que as variedades modernas (DAVIS et al., 2004 e DAVIS, 2009).

As inovações diminuíram no século passado em razão de políticas públicas e avanços científicos e tecnológicos que priorizaram sementes desenvolvidas pelas indústrias com a adoção de um sistema agrícola que um lado modifica drasticamente o meio ambiente, causando externalidades negativas à saúde humana e dos ecossistemas.

E reduzem a capacidade, autonomia e a função dos agricultores dentro do sistema. Ele deixa de ser um agricultor no sentido etimológico da palavra, para ser um produtor de matérias primas mediante uso de insumos, onde as matérias primas a produzir e os insumos a usar, não mais são decididos por ele, e sim por um agente externo que na maioria das vezes é o mesmo.

Estas externalidades negativas criadas pela Revolução Verde, aliado ao ritmo desenfreado da expansão da fronteira agrícola, a disseminação de espécies exóticas invasoras e a poluição, entre outros, geraram um nível de preocupação na comunidade científica, nos setores da sociedade ligados ao meio ambiente, bem como em muitos tomadores de decisão.
No atual contexto, em que um número crescente de espécies está ameaçado de extinção, os esforços de conservação são cada vez mais urgentes e necessários.

Esta decisão foi provocada pelo manifesto da Conferência das Partes da CDB, que tinha como objetivos aumentar a conscientização sobre a importância da conservação da biodiversidade para o bem-estar e promover a compreensão do seu valor econômico, aumentando o conhecimento público das ameaças à biodiversidade e dos meios necessários para conservá-la e incentivar as organizações a agirem em prol da conservação da biodiversidade.

Além disso, ameaças presentes e futuras podem restringir ainda mais o uso destas espécies de importância alimentar. A introdução e cultivo em larga escala de variedades transgênicas, o aumento sem precedentes do uso de agrotóxicos e a presença crescente de espécies exóticas invasoras se constitui numa ameaça real.

Referências:

ABUD, S., SOUZA, P. I. M., MOREIRA, C. T.; ANDRADE, S. R. M., ULBRICH, A. V., VIANNA, G. R., RECH, E. L. e ARAGÃO, F. J. L., Dispersão de pólen em soja transgênica na região do Cerrado. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.38, p.1229-1235, 2003.

BINIMELIS, R. Coexistence of plants, coexistence of farmers: Is an individual choice possible? Journal of Agricultural and Environmental Ethics, v. 21, p. 437–457, 2008.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Convenção sobre Diversidade Biológica. Serie Biodiversidade 2. Brasília: MMA, 2000, 32 p. (disponível em www.mma.gov.br/portalbio).

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Parentes silvestres das espécies de plantas cultivadas. Brasília, DF: MMA, 2006. 44 p. (disponível em www.mma.gov.br/portalbio).

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Metas Nacionais de Biodiversidade para 2010. Brasília, DF: MMA, 2007. 16 p. (disponível em www.mma.gov.br/portalbio).

BRUSH, S. B. The issues of in situ conservation of crop genetic resources. In: BRUSH, S. B. (ed). Genes in the field – On-Farm Conservation of Crop Diversity. Roma: IDRC/IPGRI/Lewis Publishers, 2000, p. 3-26.

CARTA CAPITAL. Os riscos da omissão, p.22-29, 18/07/2007.

CLEVELAND, D. A., SOLERI, D., CUEVAS, F. A., CROSSA, J. e GEPTS, P. Detecting (trans)gene flow to landraces in centers of crop origin: lessons from the case of maize in Mexico. In Environ. Biosafety Res., v. 4, p. 197-208. 2005.

CTNBio. RESOLUÇÃO NORMATIVA n° 4, de 16 de agosto de 2007, DOU, n° 163 de 23/08/2007, p.19. (Disponível em www.ctnbio.gov.br).

CORDEIRO, A., ALVES, A. C. e OGLIARI, J. B., Challenges for co-existence in small-scale farming: the case of maize in Brazil. In: BRECKLING, B., REUTER, H. e VERHOEVEN, R. (Org.). Implications of GM-Crop Cultivation at Large Spatial Scales. Theorie in der Ökologie 14.. Frankfurt: Peter Lang, 2008, p. 134-139.

DAVIS, D. R. Declining Fruit and Vegetable Nutrient Composition: What Is the Evidence? HortScience, v. 44, p.15-19, 2009.

DAVIS, D. R. EPP, M. D. e RIORDAN, H. D., Changes in USDA Food Composition Data for 43 Garden Crops, 1950 to 1999. Journal of the American College of Nutrition, v. 23, p. 669–682, 2004.

DONAZZOLO, J., GUERRA, M. P., BIZZOCCHI, L., VOLPATO, C. e NODARI, R. O., Manejo de paisagem e a promoção da goiabeira-serrana (Acca sellowiana) na serra gaúcha. In: I Workshop Sul Americano sobre Acca sellowiana, 2009, São Joaquim. Anais do I Workshop Sul Americano sobre Acca sellowiana, 2009.

ELLSTRAND, N. C., Dangerous liaisons? When Cultivated Plants Mate with Their Wild Relatives. Baltimore: Johns Hopkins University Press. 2003. 244p.

FERMENT, G., ZANONI, M. e NODARI, R. O., Estudo de caso: Sojas convencionais e transgênicas no planalto do Rio Grande do Sul. Brasília: MDA, 2010. 101p.
FOLHA DE SÃO PAULO. Brasil não tem controle sobre milho transgênico. p. B1 10/05./2009.

GUTIÉRREZ-ROSATI, A., POGGI, P. D., GÁLVEZ, G. M. e CÁCERES, R. R., Investigaciones sobre la presencia de transgenes en Perú: caso maíz (Zea mays L.). Revista Latinoamericana de Genética, v. 1, (10, GV-89), 2008.

HEINEMANN, J. A., A Typology of the Effects of (Trans) Gene Flow on the Conservation and Sustainable Use of Genetic Resources. Roma: FAO, Bsp35r1, 2007. 94 p.

HOYLE, M. e CRESSWELL, J. E., The effect of wind direction on cross-pollination in wind-pollinated GM crops. Ecological Applications, v. 17, p. 1234–1243, 2007.

INTERNATIONAL SERVICE FOR THE ACQUISITION OF AGRI-BIOTECH APPLICATIONS – ISAAA. URL: www.isaaa.org. Acessado em 10 de novembro de 2010.

JARVIS, D. I., PADOCH, C. e COOPER, H. D., Managing Biodiversity in Agricultural Ecosystems. New York: Columbia University Press, 2007, 512 p.

KALUZA, J., HAKANSSON, N., BRZOZOWSKA, A. e WOLK, A., Diet quality and mortality: a population-based prospective study of men. Eur J Clin Nutr., v. 63, p. 451-457, 2009.

KANT, A. K., SCHATZKIN, A., GRAUBARD, B. I. e SCHAIRER, C. A., Prospective Study of Diet Quality and Mortality in Women. JAMA, v. 283 p. 2109-2115, 2000.

MELLON, M. e RISSLER, J., Gone to Seed: Transgenic Contaminants in the Traditional Seed Supply. Cambridge: Union of Concerned Scientist, 2004. 80 p.

MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT. Ecosystems and Human Well-Being: General Synthesis. Washington, DC: Island Press, 2005, 100 p.

MITTERMEIER, R. A., ROBLES GIL, P. e MITTERMEIER, C. G., Megadiversity earth’s biologically wealthiest nations. México: CEMEX, 1997. 501 p.

NODARI, R. O. e GUERRA, M. P. La bioseguridad de las plantas transgénicas. In: BARBACENA, A., KATZ, J., MORALES, C. e SCHAPER, M. (Org.). Los transgénicos en América latina y el caribe: un dabate abierto. Santiago: Ed. Nações Unidas, 2004, p. 111-122.

NORGAARD, R. B., A base epistemológica da agroecologia. In.: ALTIERI. M.A. Agroecologia: as bases científicas da agricultura alternativa. Rio de Janeiro: PTA/FASE, 1989, p. 42-48.

PIÑEYRO-NELSON, A., VAN HEERWAARDEN, J., PERALES, H. R., SERRATOS- HERNÁNDEZ, J. A., RANGEL, A., HUFFORD, M. B., GEPTS, P., GARAY-ARROYO, A., RIVERA-BUSTAMANTE, R., e ÁLVAREZ-
BUYLLA, E. R., Transgenes in Mexican maize: molecular evidence and methodological considerations for GMO detection in landrace populations. Molecular Ecology, v. 18, p.750-761, 2009.

QUIST, D. e CHAPELA, I. H., Transgenic DNA introgressed into traditional maize landraces in Oaxaca, Mexico. Nature, v. 414, p. 541-543, 2001.

RAMIREZ-ROMERO, R., DESNEUX, N., DECOURTYEC, A., CHAFFIOLD, A. e PHAM-DELE`GUE, M. H., Does Cry1Ab protein affect learning performances of the honey bee Apis mellifera L. (Hymenoptera, Apidae)? Ecotoxicology and Environmental Safety, v. 70, p. 327–333, 2008.

REUTER, H., BÖCKMANN, S. e BRECKLING, B., Analysing cross-pollination studies in maize. In: BRECKLING, B., REUTER, H. e VERHOEVEN, R. (ed.). Implications of GM-Crop Cultivation at Large Spatial Scales. Theorie in der Ökologie 14. Frankfurt, Peter Lang, 2008, p. 47 – 53.

THE ROYAL SOCIETY OF CANADA. Elements of precaution: recommendations for the regulation of food biotechnology in Canadá. Ottawa: RSC, 2001, 265 p.

SCHUSTER, I., VIEIRA, E. S. N., SANTANA, H., SINHORATI, D., SILVA, R. B. e OLIVEIRA, M. A., O. Fluxo gênico em soja na Região Oeste do Paraná. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 42, p.515-520, 2007.

STELLA, A., KAGEYAMA, P. e NODARI, R. O., Políticas públicas para a agrobiodiversidade. In: CARVALHO, C. (ed.). Agrobiodiversidade e Diversidade Cultural. Brasília: MMA. 2004, p.41-56.

TRAAVIK, T. e HEINEMANN, J., Genetic Engineering and Omitted Health Research: Still No Answers to Ageing Questions. Third World Network, 36p. 2007.

TUXILL, J. The biodiversity that people made. Whashington, DC: WorldWatch, v. 3, p. 24-35. 2000.

VILPERTE, V., ROSA, A. M., REIS, E. O., DUTRA, S., DONAZZOLO, J. e NODARI, R. O., Caracterização fenotípica de frutos de Acca sellowiana (Goiabeira-serrana) manejados on farm no Rio Grande do Sul. In: I Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos, 2010, Salvador – BA. Anais do I Congresso Brasileiro de Recursos Genéticos. Brasília – DF: Embrapa Recursos
Genéticos e Biotecnologia, 2010. p. 281-281.

ZOLLA, L., RINALDUCCI, S., ANTONIOLI, P. e RIGHETTI, P. G., Proteomics as a Complementary Tool for Identifying Unintended Side Effects Occurring in Transgenic Maize Seeds As a Result of Genetic Modifications. Journal of Proteome Research, v. 7, p. 1850-1861, 2008.
http://www.reid.org.br/?CONT=00000248

NODARI, Rubens Onofre, TENFEN, Sarah Zanon Agapito, DONAZZ

OLO, Joel, Biodiversidade: ameaças e contaminação por transgenes, Revista Internacional Direito e Cidadania, n 7, jul a set 2010

Roberto Naime, Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Fonte – EcoDebate de 24 de agosto de 2016

Este Post tem 0 Comentários

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Back To Top