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Aquíferos Brasileiros – Cenários atuais e perspectivas de abastecimento às gerações futuras

No Brasil, o cenário sobre a situação das águas subterrâneas tem se agravado muito e tende a piorar em um futuro relativamente próximo, pois a escalada de exploração dos aquíferos continua de forma irregular, como também intensiva, mesmo com a legislação e fiscalização existentes. De fato, temos uma reserva extraordinária de água subterrânea nos chamados aquíferos – reservas com viabilidade econômica de explotação.

Tais reservas até 2010 eram estimadas em 112.300 km3 de água (1km3 corresponde a 1 trilhão de litros), sendo 42.830 km3 na região amazônica, 18.670 km3 no nordeste e 50.800 km3 na região centro-sul/sudeste. Com a realização de novos estudos sobre os aquíferos da Amazônia, principalmente o Alter do Chão, Solimões e Içá, pesquisadores da UFPA, descobriram que o potencial de armazenamento dos mesmos está em torno de 162.520 km3, formando assim o que passou a ser conhecido como Sistema Aquífero Grande Amazônia (SAGA).

Tal estudo mostrou então um acréscimo de 119.690 km3 no potencial de reserva de água subterrânea do país, com um total estimado atualmente em 231.990 km3. Porém, toda essa água não pode ser retirada para consumo, primeiro porque não temos tecnologia que permita isso e, segundo, se fosse possível, tal ação provocaria um grande colapso de ordem geológica, com a formação de abismos/crateras em diversas regiões devido ao imenso espaço vazio que seria formado.

Assim, estudos hidrogeológicos têm mostrado que a retirada de água de um aquífero deve levar em conta a quantidade de água equivalente àquela que entra anualmente a partir das chuvas, quando então é estimado o seu potencial de recarga. Por questões de segurança, principalmente para aquíferos sedimentares, a fim de evitar os possíveis colapsos já citados, recomenda-se a retirada de apenas 25% do total do potencial de recarga, conhecida como reserva explotável. Na prática, isso significa uma quantidade de água muito inferior ao que normalmente se imagina, considerando os números iniciais citados acima.

A título de exemplo, sobre a quantidade de água que deve ser explotada, tem-se o Sistema Aquífero Guarani – SAG (região centro-sul), cujo potencial de recarga ou reserva renovável é de 160 km3 ano-1 e a reserva explotável (RE) de 40 km3 ano-1. Para o SAGA, considerado 3,5 vezes maior do que o SAG, a reserva explotável chegaria então a 140 km3 ano-1, guardadas as devidas particularidades geológicas e climáticas de ambos.

No nordeste, entre os principais aquíferos estão o Urucuia que abrange parte considerável da margem esquerda do rio São Francisco e o Sistema Aquífero Serra Grande/Pimenteiras/Cabeças na Bacia do rio Parnaíba (Piauí/Maranhão e parte nordeste do Tocantins). Diversos trabalhos têm mostrado certa variação na reserva explotável desses aquíferos, com valores de 2,25 a 5,24 km3 ano-1 para o Urucuia e de 6,19 e 9,52 km3 ano-1 para o Sistema Serra Grande/Pimenteiras/Cabeças.

Outra região de destaque em reservas de água subterrânea é a do Pantanal Mato-grossense, especificamente no Mato Grosso do Sul, onde vários sistemas (Aquíferos Cenozóico, Bauru, Serra Geral e Guarani entre outros de menor porte), contribuem para a existência de um volume considerável de água, com reserva renovável da ordem de 50 km3 ano-1 e reserva explotável de 10 km3 ano-1, considerando aqui a retirada de 20% do total de recarga anual, de acordo com normas vigentes do governo estadual, ou seja, mais restritivo do que as recomendações técnicas de 25%, valor esse já citado no início do texto.

Assim, frente ao exposto, que mostra certa abundância de água subterrânea no Brasil, não podemos nos dar ao luxo de consumi-la de forma desordenada, pois o cenário acima retratado, mostra a dependência total dos aquíferos em relação a um regime regular de chuvas. Soma-se a isso, a lentidão nos fluxos subterrâneos que contribui para a reposição lenta em locais onde há retirada excessiva de água, motivo do rebaixamento frequente e quase constante do nível de muitos poços tubulares profundos em várias regiões do país. Tem-se, ainda nesse cenário, a má distribuição da população em relação a esses reservatórios, ou seja, a densidade demográfica é desproporcional à disponibilidade de água subterrânea, o que vale também para a água superficial no caso brasileiro.

A região norte, por exemplo, possui somente 12% da população brasileira e detém 70% da reserva de água subterrânea. Já a região centro-sul (sudeste/sul e centro-oeste) possui uma população em torno de 65% do total, com 22% de toda reserva de água subterrânea do país. O Nordeste, com cerca de 23% da população, possui apenas 8% de toda água subterrânea brasileira.

A partir então dessas considerações, precisamos nos preparar para atender nossos descendentes quanto à disponibilidade de água de qualidade, hoje concentrada principalmente nos aquíferos. Repensar o modelo atual de captação da água subterrânea, com critérios mais rígidos de uso, aliados a outros mecanismos de uso racional da água superficial, além de ações de incentivo à ocupação humana de áreas de baixa densidade demográfica no país, são ações fundamentais para que os mananciais subterrâneos sejam sustentáveis no tempo e assim ajudem, de fato, na sobrevivência das gerações vindouras.

Fontes consultadas

https://hal.brgm.archives-ouvertes.fr/hal-00786182/document

http://www.imasul.ms.gov.br/disponibilidade-hidrica-subterranea/

https://pt.scribd.com/document/165713992/VOLUME15-Sistema-Aquifero-Guarani-SP-MS-PR.pdf

https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/index.html

https://aguassubterraneas.abas.org/asubterraneas/article/view/27831

*Marco Antonio Ferreira Gomes & Lauro Charlet Pereira são pesquisadores da Embrapa Meio Ambiente

Fonte – EcoDebate de 08 de outubro de 2018

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