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O segredo da própolis vermelha

A rabo-de-bugio (Dalbergia ecastophyllum), uma árvore comum nos manguezais do nordeste do Brasil, é famosa por eliminar um líquido vermelho quando sofre algum ferimento no caule.

O “sangue” da árvore é na verdade um exsudato (líquido com alto teor de proteínas e leucócitos), importante para cicatrizar o tecido e evitar contaminações.

Abelhas-europeias (Apis mellifera) aprenderam a transformar essa resina em própolis que, por sua vez, serve para defender a colmeia de invasores.

“Ela diminui a incidência de bactérias e fungos, é utilizada para embalsamar intrusos que são mortos e são muito difíceis ou impossíveis de remover, evitando assim a putrefação. Também é utilizada como material de construção e para tapar buracos na colmeia”, comenta a bióloga Letizia Migliore, doutoranda do Museu de Zoologia da USP.

Rabo-de-bugio é a única planta brasileira capaz de produzir a resina vermelha — Foto: Letizia Migliore

A própolis vermelha, produzida pela abelha-europeia com a resina da rabo-de-bugio, é um remédio poderoso e conhecido há bastante tempo.

Tem propriedades medicinais antibacterianas, antifúngicas, antivirais e anti-inflamatórias.

Estudos in vitro mostraram que esse tipo de própolis tem maior atividade na inibição de bactérias gram-positivas e maior atividade antioxidante se comparada aos outros.

Um estudo recente da Universidade Guarulhos sinalizou que a própolis vermelha pode ser mais eficaz no tratamento da esquistossomose do que o único medicamento existente contra a doença

 

O que ninguém sabia é que além da árvore e da abelha, existe um terceiro elemento determinante para a produção dessa substância: o besouro.

“O Agrilus propolis estimula a liberação da resina utilizada pelas abelhas”, explica Letizia Migliore, que acaba de descrever a espécie em artigo na revista The Science of Nature.

“As larvas dos besouros do gênero Agrilus se desenvolvem no interior dos caules destas plantas e, quando o ciclo de vida se completa, os adultos saem da planta por pequenos orifícios em forma de meia lua. A resina só é liberada após o surgimento dos besouros adultos através desses orifícios”, completa Letizia – junto com outros pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto; encontrou a nova espécie de besouro em Canavieiras, na Bahia, em 2019.

Os cientistas coletaram amostras da planta hospedeira e do besouro, que foram analisados em laboratório.

“A própolis vermelha é produzida em outros países também, como Cuba e Venezuela, porém de outras origens botânicas. Ainda não foi documentada nenhuma interação como a que ocorre aqui no Brasil, mas provavelmente também existe um agente animal que desencadeia a produção da própolis nestes países”, afirma a bióloga.

Pesquisadores da USP coletaram o besouro e partes da planta na Bahia — Foto: Letizia Migliore

Tipos de própolis

As própolis produzidas no Brasil são classificadas de acordo com a localidade, a fonte botânica e a coloração.

A própolis verde é a que tem o maior volume de produção no país e é produzida principalmente no Sudeste em áreas com plantas herbáceas nativas.

A própolis vermelha é a segunda em volume de produção e é achada principalmente no Nordeste em localidades próximas à manguezais.

Há ainda a própolis amarela – comum no Mato Grosso do Sul; a marrom, do Sudeste e Sul do Brasil, e a preta, fabricada pelas abelhas a partir de resina coletada de uma planta chamada jurema-preta (Mimosa Hostilis benth).

Pesquisadores da Ufal estudam benefícios da própolis vermelha produzida em Alagoas — Foto: Reprodução/TV Gazeta

Produto Nacional

O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de própolis, com 150 toneladas por ano.

Em 2012 o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) reconheceu a Própolis Vermelha de Alagoas como produto brasileiro sem similar no mundo por possuir quatro isoflavonoides, substâncias nunca antes encontradas ao mesmo tempo em nenhuma outra própolis.

Isoflavonoides são compostos orgânicos que podem trazer benefícios no controle de doenças crônicas como câncer, diabetes, osteoporose e doenças cardiovasculares

“A partir do momento que se confirmou a participação deste agente animal no processo da produção da própolis vermelha, e que se conhece o ciclo de vida deste inseto, abriram-se portas para novos estudos, com foco não só no aumento da disponibilidade da fonte botânica nas áreas de apicultura, mas considerando também a presença do besouro”, conclui a pesquisadora.

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