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Gerenciamento de Resíduos Sólidos: afinal, de quem é a responsabilidade?

Há muito temos sido incitados a escrever sobre as questões jurídicas que envolvam o meio ambiente. Decidimos, então, iniciar este espaço com um assunto bastante em voga hoje em dia, qual seja: o Gerenciamento de Resíduos Sólidos. Assim, buscamos contribuir, ainda que de forma singela, com os tantos debates que vêm ocorrendo em nosso país em torno deste tema.

Pois bem: muitos nos têm indagado a respeito da coleta municipal de resíduos em relação a grandes geradores. Oportuna, a respeito, a notícia veiculada hoje no blog Instituto Idéias (http://blog.institutoideias.com.br/o-lixo-afinal-no-rumo-certo/), que tentaremos comentar em breves palavras (e desde quando advogado consegue falar em breves palavras?).

Veja-se que a Prefeitura de São Paulo anunciou que, em cumprimento a um Decreto datado de 2002, começará a cassar os alvarás de bares, restaurantes, lojas e outros estabelecimentos que deixarem de contratar empresas privadas para recolher seu lixo, se produzirem mais de 200 quilos por dia.

Atitude arbitrária? Absolutamente! Trata-se apenas do exercício de um dos instrumentos da LPNMA – Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, de 1981 (art. 9º, IV). Afinal, se o Município confere alvará a uma empresa que venha a causar danos ao meio ambiente, entende-se que o órgão público é co-responsável. E – destaque-se – cabe ao Ministério Público fiscalizar o cumprimento desta legislação.

Assim, por exemplo, se o Município conceder alvará, ainda que provisório, a uma oficina mecânica, por mais que a destinação do óleo lubrificante usado seja responsabilidade exclusiva dela, cabe ao órgão fiscalizador, no caso a Secretaria do Meio Ambiente, avaliar o local de disposição deste óleo lubrificante. O piso é adequado? Há riscos de contaminação do solo ou do lençol freático?

Em caso de dano potencial, deverá o Município negar o alvará, sob pena de ser co-responsabilizado em um futuro dano.

A responsabilidade pela destinação de resíduos cabe ao gerador. Mas como em Direito nem tudo é exato, vamos aos poréns. Os Municípios têm a obrigação legal de coletar os resíduos de pequenos geradores, órgãos públicos e residências. Okay, mas qual é o limite que separa o grande e o pequeno gerador? Em alguns Municípios existem leis regulamentadoras ou o próprio Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos Urbanos faz esta estipulação, seja em quilos, seja em litros. Outros, ao arrepio da lei, apenas vêm notificando empresas na qualidade de “grandes geradoras”, porém sem qualquer amparo legal para tanto.

Ocorre que esse tema permeia não só o Direito Ambiental, como também o Direito Tributário. Ora, se o Município cobra uma taxa para a coleta de resíduos e não presta o serviço a que se propõe (inclusive lançando a taxa em carnê de IPTU), é bastante discutível a necessidade de devolução em dobro deste valor.

Esta questão, porém, é delicada e pode ter vários desdobramentos, devendo ser analisada sempre caso a caso. Por vezes, uma empresa enquadrada como grande geradora pode se tornar pequena geradora se passar a reciclar corretamente seus resíduos. Se toda empresa enviasse à Coleta Municial apenas os rejeitos (o que seria o correto), não haveria a figura do grande gerador. Mas gerenciar resíduos não é só separá-los em lixeiras coloridas e bonitinhas! Gerenciar resíduos envolve uma série de outras questões e que, quando bem aplicadas, chegam a dar retorno financeiro ao empreendedor, de diferentes formas.

A tarefa de o Município enquadrar uma empresa como pequena ou grande geradora não é, todavia, das mais fáceis. Não basta ao Município fotografar, pesar, abrir sacos de lixo para verificar o que há lá dentro. A Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos, debatida durante anos, foi promulgada em 2010 (embora nada mais seja do que decorrência da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente de 1981). Eis que a lei chega jovem, formosa, com cara de má (uau!). Mas corre o risco de esbarrar no “jeitinho brasileiro do dia-a-dia”. E são esses “jeitinhos” que precisam ser encarados e evitados nos Planos de Gerenciamento de Resíduos Urbanos.

Ao longo destes anos de experiência na área do Direito Ambiental, temos visto de tudo um pouco: donos de empresas “distribuindo” sacos de lixo pela vizinhança, na calada da noite, para não serem enquadrados como grandes geradores; empresas cadeando seus contêineres; catadores informais indignados com estes mesmos contêineres cadeados e lançando fogo nos mesmos; moradores de condomínios usando contêiner de restaurantes, que acabaram sendo enquadrados como grandes geradores, embora não o fossem; discussão entre secretarias de meio ambiente e vigilância sanitária quanto ao local correto para a empresa dispor a lixeira; recicladores que passaram a cobrar para coletar resíduos recicláveis e orgânicos; catadores informais que passaram a madrugar em busca dos melhores resíduos, desarticulando as cooperativas; garis levando resíduos contaminantes em troca de um litro de refrigerante; empresas enterrando resíduos ou queimando, nos finais de semana; empresas lançando resíduos em fundos de vale; resíduos recicláveis sendo enviados para aterros classe I; etc.

Muitos destes e outros absurdos fazem parte de nosso cotidiano e o nosso intuito em demonstrá-los, aqui, é única e exclusivamente de oferecer subsídios aos Municípios que estão em fase de discussão de seus Planos de Gerenciamento de Resíduos, pois é preciso saber as dificuldades que poderão ocorrer para já agir preventivamente.

De qualquer sorte, ainda que a coleta e a destinação recaiam exclusivamente sobre o empreendedor, entendemos que o Poder Público tem a obrigação legal de fazer uso dos instrumentos de controle ambiental da LPNMA, dentre eles o de licenciamento ambiental. Assim, na esfera do meio ambiente, antes de conferir um Alvará Municipal, o Município deve analisar, com base em uma matriz de impactos ambientais e uma fiscalização in loco, a atividade da empresa e solicitar da mesma os projetos pertinentes, em especial no que tange ao gerenciamento de resíduos, tema aqui abordado.

Algumas atividades demandam de uma série de projetos ambientais, seja por obrigação de leis federais, estaduais, resoluções CONAMA, seja para cumprir requisitos de Sistema de Gestão (SGA, SGI, SMS) aplicados à empresa. Outras, ainda que não tenham legislação específica ou não gerem resíduos considerados perigosos (Classe I), também demandam rigor na concessão de Alvará por parte dos Órgãos Municiais competentes, pois até mesmo resíduos Classe II podem gerar um grau de contaminação no solo ou no lençol freático com conseqüências nefastas, e é por este motivo que em inúmeras demandas judiciais os Municípios são chamados ao pólo passivo na qualidade de co-responsáveis.

Assim, embora a responsabilidade de coleta e destinação do Município recaia apenas sobre pequenos geradores, órgãos públicos e residências, não abrangendo a coleta e destinação de resíduos de grandes geradores, mister se faz atentar para a responsabilidade subsidiária em caso de concessão de alvará para empresa potencialmente poluidora sem que a mesma apresente as medidas mitigatórias exigíveis.

Dra. Letícia R. Kochepki de Brito – OAB/PR 34258 – Advogada e Auditora em Meio Ambiente – Sócia-Proprietária da Kochepki Advocacia e Consultoria Ambiental – leti.k@uol.com.br

Fonte – Coluna Direito e Meio Ambiente de Novembro/2011

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