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Matar a natureza é matar o lucro

As empresas descobrem que a biodiversidade significa dinheiro em caixa e que a saúde do negócio está vinculada à saúde do planeta

Até pouco tempo atrás, as empresas costumavam atrelar seu nome às causas verdes principalmente como estratégia de marketing. À medida que o mundo tomava consciência das questões ambientais, em especial a degradação dos recursos naturais, demonstrar preocupação com o planeta era uma forma de lustrar a imagem da companhia e atrair os consumidores para suas marcas. Essa relação entre o mundo dos negócios e a natureza avançou dramaticamente. Se antes as empresas patrocinavam o reflorestamento de uma área ou reciclavam seu lixo, colocavam a conta na lista de despesas, sem esperar retorno financeiro. Hoje, os custos de ações como essas vão para a lista de investimentos, já que podem significar lucros e crescimento nos negócios. Conglomerados como a General Electric, o Walmart e a IBM mantêm projetos de ecoeficiência e de preservação do ambiente porque os consideram estratégicos para a própria sobrevivência. O que mudou? Para entender o fenômeno, tome-se como exemplo a Coca-Cola, uma das marcas mais valiosas do mundo.

Há dez anos, quando anunciou uma série de investimentos inéditos em projetos ambientais, a Coca-Cola não estava preocupada com o derretimento das geleiras do Ártico nem queria salvar os ursos-polares ameaçados de extinção. Diante de estudos que apontavam para a crescente escassez de água doce no planeta, a empresa se convenceu de que ignorar o problema poderia ser perigoso para o futuro de seu negócio. A água é a principal matéria-prima para a fabricação dos mais de 3.000 produtos da marca. A companhia injetou bilhões de dólares na criação de métodos e programas de reutilização e tratamento de água em suas fábricas, em mais de 200 países. Os resultados começaram a aparecer recentemente. Em cada uma das 43 unidades brasileiras, gastavam-se 5,5 litros de água para produzir 1 litro de refrigerante. Hoje esse gasto é de 2,04 litros. A redução representa uma economia de 500.000 Reais ao ano, por fábrica. “Com a população mundial perto dos 9 bilhões e a água cada vez mais escassa, não tínhamos outro caminho a seguir”, afirmou recentemente o presidente mundial da Coca-Cola, Muhtar Kent, em entrevista à revista Forbes.

“O aquecimento global, a escassez de água, a extinção das espécies e o despejo de produtos tóxicos afetaram profundamente o funcionamento da sociedade e também o das empresas”, disse a VEJA o economista Andrew Winston, da Universidade Princeton, consultor de grandes companhias para questões ambientais. “Pela primeira vez na história, os empresários deparam com limites de crescimento reais impostos por questões relacionadas à natureza”, ele completa. O mundo dos negócios e o mundo natural estão inextricavelmente ligados. Todo produto que chega ao consumidor, seja um carro, um tênis ou uma xícara de café, tem origem na extração ou colheita de bens da natureza. Esses bens, a água, as terras cultiváveis, as florestas, são finitos. Justamente nesse ponto reside o maior desafio para as empresas. Desde a Revolução Industrial, iniciada no Século XVIII, o modelo econômico mundial privilegiou a produção em detrimento da preservação dos recursos naturais. Essa conta está sendo cobrada agora – e é bem cara.

A destruição da biodiversidade nunca foi tão intensa. De acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas divulgado no mês passado, mais de 60% de todos os ecossistemas do planeta estão ameaçados. Desse total, 35% são mangues e 40% florestas. Hoje, a demanda por recursos naturais excede em 35% a capacidade da Terra. Se a escalada dessa demanda continuar no ritmo atual, em 2030 serão necessárias duas Terras para satisfazê-la. Entre 2000 e 2005, a devastação das florestas na América do Sul foi de 4,3 milhões de hectares, 3,5 milhões deles no Brasil. De acordo com a ONU, só o desmatamento e a degradação de áreas de mangue causam um prejuízo anual de 2,5 a 4,5 trilhões de dólares à economia global. Equivale a jogar no lixo um valor próximo ao PIB do Japão, o segundo maior do mundo.

Nesta semana, em Busan, na Coreia do Sul, representantes de um conjunto de países estarão reunidos para discutir a criação de um grupo destinado a estudar as consequências das alterações na biodiversidade do planeta. Será um organismo semelhante ao IPCC, da ONU, que estuda as mudanças climáticas e seus efeitos. O material de trabalho do grupo a ser formado é o relatório “Aspectos econômicos dos ecossistemas e da biodiversidade”, elaborado por treze países, entre desenvolvidos e emergentes, cuja última parte será divulgada em outubro. Estima-se que ele terá o mesmo impacto do estudo sobre as mudanças climáticas divulgado em 2006 pelo economista inglês Nicholas Stern, que norteou boa parte das pesquisas sobre o tema a partir de então. A criação da nova equipe se justifica porque os problemas na biodiversidade, em grande parte, ocorrem em pontos específicos do planeta, enquanto a questão do clima tem alcance global.

Calcular, em dinheiro, o prejuízo da destruição dos recursos naturais não é tarefa fácil. Primeiro, é preciso atribuir um valor monetário a toda a biodiversidade da Terra. O economista Robert Costanza, da Universidade de Vermont, foi o primeiro a fazê-lo. Em 1997, ele concluiu que a biodiversidade do planeta valia 33 trilhões de dólares. São 45 trilhões de dólares, em valores atuais. Para chegar a essa quantia, estimou-se quanto custariam os serviços prestados gratuitamente pela natureza ao homem, como a água limpa, o solo fértil para plantio de alimentos, a purificação do ar pelas florestas, a polinização e outros recursos naturais. Foram avaliadas dezessete categorias, que ganharam o nome de serviços ambientais. “A conta é complicada e pode implicar erros pontuais, mas até agora é a única maneira eficiente que os ambientalistas e economistas encontraram de mostrar para a sociedade e para as empresas quanto está sendo desperdiçado”, diz Ernesto Cavasin, especialista em sustentabilidade, da consultoria PricewaterhouseCoopers.

A criação de índices de sustentabilidade nas principais bolsas de valores do mundo reflete a valorização das companhias verdes. Quando o mercado de capitais, centro financiador do desenvolvimento econômico, cria um índice, dá um recado explícito às empresas do que ele procura. Nesse caso, o mercado deixou claro que a agenda socioambiental não pode ser ignorada pelas empresas que querem prosperar. Na Bolsa de Valores de São Paulo, o índice de sustentabilidade (ISE), criado há cinco anos, mostra resultados melhores do que o índice tradicional. No ano passado, as ações medidas pelo índice Ibovespa subiram 18,5%, enquanto as medidas pelo ISE da Bovespa aumentaram 24,7%. Atualmente, 34 empresas integram essa carteira de ações. “O mundo financeiro se move de acordo com a sua percepção de risco. Aos olhos dos investidores, a falta de preocupação ambiental de uma companhia denota falta de zelo com o próprio patrimônio”, explica Sônia Favaretto, diretora de sustentabilidade da BM&FBovespa.

Há quinze anos, a Sadia começou a ter problemas com as fazendas que lhe fornecem os porcos para a produção de alimentos industrializados. Os ambientalistas queixavam-se de que o dejeto dos animais, rico em metano, um dos principais gases do efeito estufa, era descartado no ambiente sem controle algum. As reclamações trouxeram muitas dores de cabeça para a Sadia, mas a companhia conseguiu tirar vantagem da situação. Primeiro, desenvolveu uma técnica para transformar os dejetos em adubo e depois em energia elétrica. O metano, quando queimado, tem o seu impacto na atmosfera reduzido em 21 vezes. Com 1.086 suinocultores parceiros do projeto, a Sadia pretende, agora, lucrar com a iniciativa com a venda de créditos de carbono.

Um marco na adesão das empresas à economia verde se deu em 2005, quando a General Electric e o Walmart, duas das maiores empresas do mundo, começaram a reformulação em seus negócios. A GE lançou uma linha batizada de Ecomagination, inicialmente com dezessete produtos. Eles aliavam um menor custo de produção a um menor impacto no ambiente. Hoje, a linha conta com oitenta produtos, que vão de lâmpadas fluorescentes a motores de trem que emitem menos CO2 e consomem menos água. Em 2008, a empresa lucrou, só com a linha verde, 17 bilhões de dólares, 21% a mais do que no ano anterior. Com o lema “Aqui preservar é um bom negócio”, o Walmart começou uma transformação no modelo tradicional de varejo. Dizendo-se preocupado com o futuro do planeta, o então presidente mundial da rede, Lee Scott, anunciou que a empresa deveria, a longo prazo, utilizar em suas lojas 100% de energia renovável, reduzir a zero a produção de lixo em sua operação e vender apenas produtos que não ameaçassem a natureza. Desde então, a maioria das lojas do Walmart conseguiu economizar 25% de energia. No Brasil, 140 das 388 lojas encaminham seus resíduos para reciclagem. Eles são transformados em ração para animais ou adubo.

Os caminhos até uma economia verde e sustentável começaram a ser traçados na década de 70, quando os efeitos danosos da industrialização no ambiente se tornaram mais visíveis. Em 1987, a expressão desenvolvimento sustentável foi definida no relatório “Nosso futuro comum”, também conhecido como Relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, da ONU. Surgia a idéia de que o desenvolvimento não deveria implicar riscos à natureza a ponto de prejudicar as gerações futuras. No decorrer da década de 90, com as discussões em torno do aquecimento global, a sociedade começou a pressionar as instituições financeiras para boicotar grandes poluidores. Surgiu assim, em 2002, o tratado Princípios do Equador, a primeira intervenção real do setor econômico na questão da preservação da natureza. No acordo, dez dos maiores bancos do mundo se comprometeram a não emprestar dinheiro a empresas que desprezassem as preocupações com o ambiente em suas atividades. Era questão de tempo para que, ao longo da década, as empresas de todos os ramos de atividade descobrissem que destruir a natureza é reduzir seus próprios lucros.

Varejo sem desperdício

No ano passado, a rede de supermercados Pão de Açúcar investiu 60 milhões de reais em iniciativas sustentáveis. As mais vistosas são as sete lojas verdes espalhadas pelo país. Elas são equipadas com lâmpadas de LED, mais econômicas. Os tetos têm um revestimento especial para manter a temperatura estável no ambiente, reduzindo o consumo de eletricidade com ar condicionado. Já os carrinhos dessas lojas são feitos de garrafas PET recicladas. Juntas, as unidades proporcionam ao grupo uma economia de 140.000 reais por mês.

O executivo mais verde do mundo

Jeffrey Immelt, que em 2001 assumiu a presidência mundial da General Electric no lugar do lendário Jack Welch, está à frente da maior reformulação da história da companhia. Ele é o idealizador do selo verde Ecomagination, que hoje conta com oitenta produtos. Eles vão de lâmpadas flurescentes a turbinas que emitem menos gases do efeito estufa.

O plástico de cana-de-açúcar

A petroquímica Braskem, do Rio Grande do Sul, anunciou no ano passado a criação do polietileno feito com cana-de-açúcar. Essa é uma das resinas mais utilizadas na fabricação de embalagens flexíveis e normalmente é feita com petróleo. Somente na construção da fábrica do novo produto foram investidos 500 milhões de Reais. O polietileno de cana começa a ser produzido em escala industrial a partir de setembro.

Aí já é demais, forçaram a barra. Estamos falando de economia de recursos naturais para as gerações futuras e enquanto isso vamos queimar nafta nas usinas refinadoras de petróleo e usar plástico de comida, porque se a nafta, que é um subproduto do refino do petróleo que equivale de 3 a 7% não for transformada em plástico irá ser queimada sem ter utilidade para a humanidade.

Qual a lógica em usar terra fértil e água limpa para plantar comida e depois, ao invés de alimentar os mais de 1 bilhão de famintos do planeta, transformar esta comida em plástico e ainda mais um plástico que irá durar tanto quanto o plástico feito de petróleo, isto é 500 anos. Assim não dá, não é lógico não é racional, é uma insanidade!!!

A riqueza da biodiversidade

Um grupo de pesquisadores calculou quanto valem os recursos naturais que o homem utiliza. Outro estudo mostra o valor das perdas na biodiversidade causadas pela ação humana (em dólares).

Qual o valor da natureza?

Valor: 44,9 trilhões de dólares, o equivalente a três vezes o PIB do Estados Unidos, é o valor estimado do capital natural, ou seja, de todos os serviços ambientais da Terra (o cálculo do valor da biodiversidade, feito pelo economista americano Robert Costanza, inclui 9 trilhões de dólares relativos ao valor de outros recursos naturais).

Prejuízo: as perdas anuais com a destruicao de florestas, mananciais e mangues variam entre 2,5 e 4,5 trilhões de dólares

Solo e terras cultiváveis

Valor: 23,2 trilhões

Prejuízo: 100 bilhões anuais, relativos ao desequilíbrio ambiental só nas lavouras dos Estados Unidos, Austrália, África do Sul, Índia e Brasil

Cardumes e peixes

Valor: 4 trilhões

Prejuízo: 34,4 bilhões por ano, relativos ao que é pescado mas não é consumido

Reservas de água doce

Valor: 3,1 trilhões

Prejuízo: 28,4 bilhões é o custo anual da esassez de água e das más condições sanitárias no continente africano

Proteção natural contra desgastes

Valor: 1,5 trilhão

Prejuízo: 23 bilhões, custo das enchentes em plantações da China, Índia, Bangladesh e Vietnã em 2007

Polinização

Valor: 540 bilhões

Prejuízo: 15 bilhões por ano, causado pela redução das colméias nos Estados Unidos

Alimentos

Valor: 1 trilhão

Prejuízo: 1 bilhão é o custo anual do desperdício de comida apenas nos Estados Unidos

Clima

Valor: 2,5 trilhões

Prejuízo: de 28 a 67 bilhões por ano é quanto custaria combater os efeitos do aquecimento global reduzindo as emissões de CO2 nos países em desenvolvimento

Fontes – FAO, ONU, EPA e Teeb

Fonte – Revista Veja de 09 de junho de 2010

Foto – Davey S

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